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Renato Neves: um homem que vive de olho na Várzea

Ele já foi jornaleiro, trocador de ônibus, serralheiro e mecânico. Entre 1962 e 1966, jogou nas categorias de base do Atlético-MG, mas uma contusão no joelho o fez desistir do sonho da bola e por os pés no chão. A realidade de ter que ganhar grana e se sustentar falou mais alto. Aos 20 anos, iniciou a carreira como treinador. Desde então, Renato Neves Sobrinho, de 62 anos, respira futebol e, além de ter comandado equipes juvenis em clubes da capital e times amadores, descobriu talentos que fizeram a alegria de algumas das maiores torcidas do país.

No fim dos anos 1980, o atacante Euller jogava no Venda Nova, clube amador de Belo Horizonte. Renato o viu jogar uma vez, o suficiente para ver no Filho do Vento, como posteriormente ficou conhecido, qualidades para se tornar um grande jogador e o levar para o América-MG.

“Achei que era bom de bola demais. Eu disse: ‘O América tem alguns jogadores aqui que vão vencer, você é um deles’. O domínio de bola dele em velocidade me chamou atenção.”

Euller jogou em grandes clubes como Atlético-MG, São Paulo, Palmeiras e Vasco, tem no currículo títulos nacionais e internacionais e vestiu a camisa da Seleção Brasileira.

Além do atacante Euller, as carreiras do lateral-esquerdo Ronaldo Luís e do meio-campo Palhinha tiveram o dedo e o olhar de Renato. Foi ele quem indicou os jogadores, que estavam no Santa Tereza, para o América-MG, onde começaram a carreira profissional e de lá saíram, em 1992, para grandes clubes, como o São Paulo – os dois foram bicampeões da Copa Libertadores da América e do Mundial Interclubes pelo clube paulista. Além de ter colecionado vários títulos no futebol amador, quando o assunto era revelar talentos, Renato tinha credibilidade.

“Sempre me ligavam: ‘Olha, tem um menino bom de bola aqui’. E eu ia lá ver”, lembra. Hoje, descobrir aquele jogador que pode brilhar nos gramados, na opinião de Renato, é mais difícil.

“O menino bom de bola de 15 anos já tem a figura do empresário. Isso dificulta um pouco as coisas”, afirma. Outra barreira é a escassez de campos de várzea em Belo Horizonte:

“Esses espaços acabaram, agora se está buscando retomar essa cultura. Há 20 anos, o olheiro saía de casa e, só pela manhã, num raio de cinco quilômetros, rodava 16 campos”. Um bom porte físico, noção de espaço, colocação dentro de campo, habilidade e domínio de bola são características essenciais para quem quer se dar bem nos gramados. Segundo Renato, há 30 anos valorizava-se mais a habilidade, hoje a história é um pouco diferente.

“É uma correria danada. Os clubes valorizam muito a força física. Não sou contra, mas deve-se aliar qualidade técnica a preparo físico”.

Disponibilidade de tempo é fundamental para o olheiro, que assim poderá ir aos campos e quadras em busca dos tão procurados craques.
“É na várzea que se descobre o jogador”, aponta.

Nos mais de 40 anos trabalhando com futebol, os amigos que fez são sua maior alegria, mas Renato não esconde que ver um atleta que foi descoberto por ele fazer sucesso tem um gosto especial.

“Esse aí tem a minha mão”, diz, estampando um sorriso de missão cumprida.